Direto de Brasília-DF.
A questão da tributação de livros é mais profunda que as manchetes e a esmagadora maioria das abordagens feitas pelos meios de comunicação. Ela é estrutural.
Ao referir-me à estrutura quero dizer que está enraizado em nosso inconsciente um desvalor conjuntural, ou seja, nossos governantes não têm capacidade intelectual para alcançar o valor da cultura do livro, nossos editores são gananciosos demais e por esta razão cobram caro de escritores para editar seus livros, alguns inclusive intermedeiam serviços de revisão dos livros sem cumprir o que prometem. Em verdade tratam ao escritor(a) com descaso e ao livro apenas como mais um produto comercial.
Os distribuidores de livros, a sua vez, cobram caro para levá-los até às livrarias do país e estas, por sua vez, cobram caro do escritor para expor o livro em algum cantinho da vitrine. Ao final, cobram caro também do consumidor. Para você que pensava que só existia o maldito “jabá” no mundo da música, saiba que existe também no mercado literário.
O que todos da cadeia produtiva desse nicho de Mercado têm em comum é que dizem que cobram caro por seus serviços, porque os tributos consomem a maior parte dos lucros. A cadeia produtiva começa com o escritor, pois é o gênio criador da obra, segue com o editor, passa pelo distribuidor, passa pelas prateleiras e gôndolas das livrarias e termina nas mãos do consumidor, sempre de forma inflacionada.
O *CELAG – Centro Estratégico Latinoamericano de Geopolítica, que desde 2014 analisa os fenômenos políticos, sociais e econômicos na América Latina e Caribe, publicou em abril deste ano um relatório intitulado “O enigma dos preços na América Latina” no qual conclui, em alguns aspectos, o que venho dizendo em meus artigos e especialmente no livro “Do alarmismo apocalíptico ao ressurgimento social e econômico – mundo utópico, mundo distópico”, ou seja, há uma relação cultural de consumo equivocada entre o valor dos produtos, sua qualidade e o preço pelo qual é vendido.
Para elaborar o relatório, o CELAG tomou por base uma cesta básica fictícia sem incluir livro, mas com 7 produtos comercializados em todos os países da AL e Caribe e comparou os preços. Eis dois excertos do relatório que uso para ilustrar o conteúdo deste artigo:
“Com referência a essa cesta hipotética, o maior salário real da América Latina corresponde ao Paraguai e à Bolívia, que podem consumir 4,1 e 3,5 cestas, respectivamente, seguidos do Panamá e da Argentina7, com 2,7, e do Equador, com 2,6 cestas, respectivamente. Os salários da Colômbia, México, Uruguai e Peru têm menor poder aquisitivo sobre essa cesta hipotética (2,1, 2,4, 2,3 e 2,0 cestas respectivamente), enquanto, no Brasil, o salário mal chega para consumir 1,5 cestas, ou seja, requer 65% do salário (gráfico 5)…
Vemos que existe uma relação positiva entre o poder de compra do salário e salário em dólares, no entanto, a partir de um limiar de salário em torno de $350, o salário real estagna em torno de uma capacidade de compra de 2-3 cestas.
Esta situação implica que as economias latino-americanas podem ter altos salários em dólares, mas baixo poder aquisitivo. Esses são os casos do Panamá, Chile, Equador e Uruguai, todos com salários próximos ou superiores a 400 dólares mensais, no entanto, têm o mesmo poder aquisitivo da Argentina, cujo salário é bem inferior, e possuem menor poder aquisitivo que a Bolívia e Paraguai com salários mais baixos.”
No relatório, o CELAG conclui que há uma relação de causalidade entre salários altos e preços altos. Particularmente indago se os preços sobem porque o salário mínimo e demais salários de Mercado sobem, ou se os salários é que tentam alcançar o aumento constante de preços. Eis porque divirjo, em parte, do Relatório no ponto em que afirma que “os preços sobem na medida em que os salários podem pagar”.
A relação de causalidade entre salários e preços não é nem jamais foi absoluta. Primeiro porque a multidão dos que não possuem emprego assalariado no mundo é assustadoramente grande; segundo porque há regiões superpopulosas como China, Índia e África em que famílias vivem com menos de DOIS DÓLARES por dia; terceiro porque nos países em que se registra maior número de empregos assalariados, a inflação tem por fundamento o aumento de preços ao consumidor e devora a maior parte dos salários mínimos, com os itens mais básicos e necessários para evitar a inanição da população mundial.
As Constituições “Democráticas” de Direito da maioria dos países, não passam de uma tremenda fraude. Prometem democracia substancial e só entregam a falida democracia formal, negando assim o direito à transporte, saúde, educação, alimentação, moradia, segurança, previdência social, proteção à maternidade, proteção à infância, assistência aos desamparados, lazer.
Diga-me, o fato da distância global entre as classes econômicas só aumentar, inclusive com a criação oficializada dos miseráveis econômicos não deve ser interpretado como falência de tais argumentações?
Que resistência os “miseráveis” e a classe pobre pode oferecer aos constantes aumentos de preços, inclusive no que diz respeito a produtos e serviços miseravelmente ruins que não oferecem a menor qualidade, como ocorre em toda a América Latina, África, leste europeu e parte da Ásia?
Livro não é produto a integrar a cesta básica porque a fome do estômago vem primeiro que a fome do cérebro. É compreensível. Mas, uma pessoa que deseja prosperidade neste mundo meritocrático para o qual o Mercado de Trabalho exige talentos úteis, e da mesma forma um país que deseje prosperar de forma sustentável necessita de cérebros bem alimentados pelo conhecimento, engenhosidade e fantasia, que os escritores depositam em livros.
Menosprezar o escritor e o bom produto de seu gênio criativo (o livro) é sinal evidente de debilidade dos governos, editores, distribuidores e de livrarias físicas e virtuais, pois se concordamos que um “um país se faz com homens e livros” e que, “quem mal lê, mal ouve, mal fala, mal vê”, então o investimento que estamos fazendo para nosso futuro enquanto sociedade, é zero. O futuro, que chega a cada segundo, segue cobrando pelo equívoco dessas nossas decisões, da mesma forma que o tempo, todos os dias, faz chorar de arrependimento, a milhões de negligentes… de que lado você está?
Não perca o capítulo final, quarta-feira, 9 de junho.
E em breve estreia a nova série: “CORRUPÇÃO DURANTE A PANDEMIA. VIDAS HUMANAS, O QUE ISTO IMPORTA?”
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*disponível na íntegra em: https://www.celag.org/wp-content/uploads/2021/04/el-enigma-de-los-precios-en-latinoamerica.pdf