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O PROCESSO DE EDUCAÇÃO E ENSINO NA IDADE MODERNA. EPISÓDIO DE HOJE: O surgimento das Universidades e sua influência no processo educativo (Final)

Tomás de Aquino viveu (1224-1274) com a disposição de demonstrar que fé e intelecto não são antagônicos. Ensinava na Universidade de Paris não haver contradição entre ciência e fé, uma vez que ambas procediam de Deus; que o processo educativo deriva da razão e suas faculdades sensíveis residentes no intelecto; que a instrução advém do Mestre e que pode ser decifrada pelo aluno e levar este ao conhecimento de certezas sobre a vida e sobre o universo sem oposição às verdades divinas.

Como fruto de suas reflexões de aulas e anotações diversas, Tomás de Aquino formula e escreve uma teoria própria sobre o processo educativo e a chama de “Sobre o Mestre” ou De Magistro. Seu modo de pensar o afasta das ideias franciscanas, que adotam a metafísica espiritual de Platão e de Santo Agostinho.

Tomás de Aquino, a sua vez, opta por seguir as pegadas antropocêntricas e tão pragmáticas quanto científicas de Aristóteles, o “pai de todas as ciências”.

A ordem dos dominicanos, fundada por Domingos de Gusmão, tornar-se-à uma ala militante intelectual dentro da Igreja e contribuirá com a Escolástica de Aristóteles, ou seja, o ensino que busca uma explicação metafísica para o universo, mas que também busca uma explicação racional para o relacionamento do homem com o universo.

Fundamentado na Dialética e Escolástica Aristotélica de Santo Tomás de Aquino, os dominicanos aprofundam a sede de saber na Universidade de Paris, porque a Dialética não é o “Sim ou Não”, mas, o Sic et Non, ou seja, tanto o sim quanto o não podem vir a ser expressão de verdades que devem ser conhecidas e racionalizadas.

Mesmo com a proibição de estudar e ensinar as obras de Aristóteles fica evidente que o grande filósofo e cientista não pode ser destruído por Decreto e quem prova isto é Tomás de Aquino. Por volta de 1229 mestres e alunos abandonam Paris para poder estudar a filosofia natural e racional de Aristóteles aonde quer que ela não estivesse proibida.

Em Paris, Aristóteles fica banido publica e academicamente por 11 anos. Somente em 1240 volta a ocorrer uma nova onda publica de interesse por Aristóteles, assim como por pensadores árabes como Avicena e Averroés e pelo pensador judaico Moshe Ben Maimon ou Maiomonides, que serão influências fortes na Faculdade de Artes. Esta, em 1261 consegue libertar-se da influência religiosa e segue seu caminho solo e os franciscanos e dominicanos, agora, ficam restritos à faculdade de Teologia.

Em 1255 o papa Alexandre IV assina Decreto permitindo às Universidades ensinarem obras recém-descobertas, como os tratados aristotélicos sobre Física e Metafísica. Aquela separação entre religiosos na faculdade de Teologia e os seculares na faculdade de Artes, somado ao decreto papal permitiu o estudo da filosofia natural e racional, mas isto, outra vez, sofreria ataque dos franciscanos e dos dominicanos fundamentalistas.

Foi assim que outra reação contra a Escolástica de Aristóteles e Tomás de Aquino começaria pouco antes da morte deste, em 7 de março de 1274, com apenas 49 anos. Em 1270 o Bispo de Paris, Etienne Tempier, condena a Escolástica Aristotélica e de Tomás de Aquino. A Europa, outra vez, vai mergulhar nas trevas da ignorância. Por estas ondas históricas é que insisto em dizer que o ditado popular que diz que a ignorância é uma benção deve ser relativizado. A ignorância pode ser uma sentença condenatória a uma vida de miséria e domínio.

Apesar das proibições impostas às universidades de ensinarem os clássicos gregos e latinos que ameaçassem o poder da Igreja, o que se vê entre o século XIII até as últimas décadas do século XIV é o crescimento da curiosidade científica, do nacionalismo e o declínio do poder do papado.

A Wikipedia explica que “Entre 1309 e 1377, a residência do papado foi alterada de Roma para Avinhão, na França, pois o Papa Clemente V foi levado (sem possibilidade de debate) pelo rei francês para residir em Avinhão. Em 1378, o Papa Gregório XI voltaria para Roma, onde faleceria. A população italiana desejava que o papado fosse restabelecido em Roma. Foi então eleito Urbano VI, de origem italiana. No entanto, ele demonstrou ser um papa muito autoritário, de modo que uma quantidade considerável do Colegio dos Cardeais, anularia a sua votação e foi realizado um novo conclave, sendo eleito Clemente VII, que passou a residir em Avinhão. Iniciara-se assim o Cisma, em que o Papa residia em Roma e Antipapa residia em Avinhão”

Nessa crise de poder entre o Estado e a Igreja, há poucos mestres que têm coragem de ensinar os clássicos. Pelo lado social a peste negra dizima quase um quarto da população europeia. A peste negra ou peste bubônica que matou entre 75 a 200 milhões de pessoas era extremamente séria para a época. Hoje, sabe-se que é tratada por antibióticos e não seria em nada devastadora como foi, visto que a doença é transmitida por pulgas que infestam roedores, como ratos pretos, por exemplo.

Mas, para uma comunidade religiosa radical um fato como uma pandemia pode facilmente ser interpretado como castigo divino, como foi a AIDS/SIDA no século XX, o coronavírus e outras epidemias e pandemias que assolam nosso mundo, seja por manipulação descuidada de vírus em laboratórios, seja por guerras biológicas que serão sempre negadas pelas autoridades, seja pela simples falta de higiene da população que insiste em jogar lixo na rua e depois em reclamar da falta de capacidade do escoamento sanitário. Nestas hipóteses apocalípticas a tendência é um prevalecimento da ortodoxia sobre qualquer movimento intelectual e foi isto, também, que contribuiu para a Europa se fechar para universidades e outras agências de educação e ensino.

Em grande parte da Europa a ignorância do povo garantiria o domínio aristocrático e do clero, ante uma população que não entendia mais de grego nem de latim clássicos. Livros sobre racionalismo foram banidos, a missa se rezava em latim para um povo que de latim nada entendia. O povo, assim, parecia um rebanho sendo conduzido ao “matadouro”, para ser sacrificado no altar da ignorância.

O que poucos admitem é que o conhecimento desses fatos, aos poucos “mataria Deus” na consciência de muita gente que aprendeu a pensar e ver o quanto “Deus” estava longe quem dizia representá-lo, exatamente como vemos acontecer nos dias atuais.

Felizmente, à  morte a vida se antepõe e, foi assim que um movimento cultural e intelectual chamado Renascença ou Renascimento, surgiu na Itália para trazer um alento novo ao mundo.

A Renascença será tema dos próximos artigos desta série sobre a história da educação e do ensino.

Sobre o autor

Formado em Direito, Pós-graduado em Política e Estratégia pela Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG) e pela Universidade de Brasília (UnB). Concluiu Doutorado em Ciências Jurídicas e Sociais na Universidad Del Museu Social Argentino, Buenos Aires-AR, em 2012 e Pós-Doutorado em Tradição Civilística e Direito Comparado pela Universidade de Roma Tor Vergata. Professor de Hermenêutica Jurídica e Direito Penal nas Faculdades Integradas do Planalto Central e de Direito Penal, Processo Penal e Administrativo em cursos preparatórios para concursos, por 19 anos, em Brasília, Goiânia, Belo Horizonte e Porto Alegre. É Palestrante. Já proferiu palestras na Universidade de Vigo-Espanha e Universidade do Minho, Braga-Portugal, sobre seu livro e, Ciências Sociais "A mulher e sua luta épica contra o machismo". Proferiu palestra na University of Columbia em NYC-US, sobre sua Enciclopédia Corruption in the World, traduzida ao inglês e lançada pela editora AUTHORHOUSE em novembro/2018 nos EUA. É Escritor com mais de 15 livros jurídicos, sociais e literários. Está publicado em 4 idiomas: português, espanhol, inglês e francês. Premiado pelo The International Latino Book Awars-ILBA em 2013 pelo romance de ficção e espionagem “O gestor, o político e o ladrão” e em 2018 mais dois livros: A novela satírica, Sivirino com “I” e o Deus da Pedra do Navio e o livro de autodesenvolvimento “Obstinação – O lema dos que vencem”, com premiação em Los Angeles/EUA. Seu livro de poemas “Rasgos no véu da solidão”, em tradução bilíngue português/francês foi lançado em junho/2018 na França. Eleito em 17/11/2018 para o triênio 2019/2021, Diretor Jurídico do SINDESCRITORES (Sindicato dos Escritores do Distrito Federal), o primeiro e mais antigo Sindicato de Escritores do Brasil.

Judivan J. Vieira
Procurador Federal/Fiscal Federal/Federal Attorney
Escritor/Writer - Awarded/Premiado by ILBA
Palestrante/Speaker/Conferenciante

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