Direto de Madri/Espanha.
Marco Fábio Quintiliano O homem que sistematizou em definitivo o processo educativo e de ensino romano
Cícero já houvera falecido há mais de três décadas quando Quintiliano lança suas obras e dentre elas a enciclopédia “Institutos da Oratória” ou “Sobre a formação do Orador”, composta de 12 livros e cujo nome é bem parecido com a obra de Cícero “Sobre o Orador”.
Quintiliano, todavia, foi além! Para o bem ou para o mal ele vai estabelecer que o ensino deve se guiar com três elementos: objetivo, método e conteúdo. Esse sistema ainda vigora até hoje.
A sistematização do ensino proposta por Quintiliano e incorporada pelo Império tem os seguintes fundamentos, além dos que já se disse:
1 – Os professores devem ser capacitados pelo Império;
2 – O instrutor ou professor é o intermediário entre a educação recebida da família e a preparação para que o aluno seja moralmente bom e apto como um investigador científico;
3 – O conteúdo do ensino deve ser adaptado à idade do aluno, para que haja correspondência entre o conteúdo oferecido e a capacidade de absorção;
4 – Devem ser proibidos os castigos físicos como método de disciplina. Ao invés as escolas devem adotar meios para estimular os alunos com encorajamentos vários e até premiações;
5 – O Aluno deve aprender simultaneamente várias matérias ao invés de uma por vez e a solução de problemas técnicos deve fazer parte de cada disciplina, para que o aprendizado seja prático e útil ao cotidiano.
Observe-se que todos os fundamentos enumerados, inclusive, a preocupação com objetivo, método e conteúdo são, com algumas pequenas diferenças, as preocupações que ainda hoje norteiam os diversos processos educativos de nosso mundo.
Quando o “Pão e o Circo” sufocam o processo educativo e de ensino
Parece-me que certas ideias prósperas que começam como movimento, tendem a morrer logo que se transformam em monumento.
Foi assim também com o processo educativo e de ensino de Cícero e principalmente de Quintiliano. O Século II d.C., é visto pela história como o período de declínio intelectual e moral em razão da deturpação do epicurismo, que descamba para o hedonismo e sua ênfase no extremo prazer do corpo. É certo que o corpo necessita de prazer. Afinal, não somos máquinas insensíveis. A grande questão é saber dosar esse prazer, inclusive para que ele e o corpo durem mais em simbiose…
Para a ciência política não há espaço de Poder vazio que não seja ocupado por outra forma de Poder. O desprezo lento pelo conhecimento que começa ainda no Século I e tem como gesto bastante simbólico a expulsão dos filósofos de Roma, por seu imperador Domiciano (Tito Flávio Domiciano), tem o efeito de demarcar uma nova época cultural em que os valores da educação são substituídos pelos prazeres superficiais e vazios.
O Império Romano estava em crise intelectual e moral com festas e bacanais hedonistas que não cessavam e que aplacavam o desejo de prazer imediato, contra o prazer que a educação e ensino proporcionam somente a médio e longo prazo.
A política seguia comandada por ditadores e membros de um Senado, cujos interesses pessoais sobrepujavam os interesses do povoe nisto, nada diferente do senado brasileiro, norte americano ou francês.
A prosperidade econômica do Século I d.C., atraiu tanta gente que a cidade de Roma foi praticamente “favelizada”. Esta migração do interior para a promessa de uma vida melhor na “capital”, ocorre porque é nas cidades que as pessoas imaginam encontrar o mínimo de dignidade social como trabalho remunerado, moradia, segurança, lazer.
Mas, esse intenso movimento migratório e imigratório dentro do Império teve efeito contrário em e, com medo de insurreições da legião de “miseráveis”, imperadores como Domiciano, Nerva, Trajano e Adriano, adotaram uma estratégia que foi identificada em latim como “panem et circenses” ou política do “Pão e do Circo”, citada pelo poeta humorista e escritor satírico JUVENAL em sua obra “Sátiras”.
Durante a vigente política do “pão e circo” o povo trabalha um dia e tinha um ou dois reservados para se diverti nas arenas e espetáculos sangrentos, de música, teatro ou qualquer outro que mantivesse o povo anestesiado. Eram 182 dias de ”circo”, por ano.
Uma vez que o processo educativo e de ensino somente poderia produzir prazer a médio e longo prazo, os governantes resolveram preencher o cérebro das massas com a alegria instantânea, por meio da diversão como lutas de gladiadores, escravos e “inimigos do império” contra animais ferozes, corridas de bigas, acrobacias, espetáculos com palhaços, corridas de cavalo, parecidos com o atual espetáculo de lutas do MMA ou Bellator. Assim, conseguiram acalmar as massas e mantê-las sobre os “arreios e cabrestos” da ignorância. A diferença é que este circo de hoje paga bem.
A necessidade de pensar de forma sistêmica e lógica foi desaparecendo aos poucos, juntamente com o método crítico-lógico grego. Não havia mais a necessidade de conhecimento profundo sobre coisa alguma.
Saber o suficiente para o dia a dia bastava ao pragmatismo do processo educativo e de ensino romano, em que o Direito Civil e suas variantes florescia por meio de conhecimento codificado no qual a criatividade não tem vez e quem pensa e contesta torna-se ameaça.
A educação e o ensino romanos foram reduzidos a uma espécie de “decoreba” de formas e fórmulas na gramática, retórica, aritmética, geometria, astronomia, música e no que restava dos ensinos filosóficos de autores romanos que não ameaçassem o currículo pronto do império.
Aos poucos, o processo educativo e de ensino romano sepulta a ciência investigativa, ressuscita os dogmas dos múltiplos deuses latinos que não passavam de imitação dos deuses do Olimpo, privilegia a superficialidade dos ignorantes e torna-se uma espécie de “crônica de uma morte anunciada”, como diria Gabriel Garcia Marquez…
Inegável é que quando deixamos de questionar e permitimos que pensem por nós, cavamos a sepultura ou acendemos a caldeira que há de transformar nossos cérebros nas cinzas que adubarão a supremacia de terceiros que, cedo ou tarde governarão sobre nós…
Até breve!