Como disse no artigo anterior somos um país, para quem não sabe, de boas leis. O que falta a nossa classe de governantes é boa índole.
Posso exemplificar boas leis: a Constituição Federal, a Lei de Improbidade administrativa, a Lei de Responsabilidade Fiscal, a Lei dos Crimes Contra a Ordem Tributária.
Outro dia criei um Anteprojeto de Lei dos “Crimes Contra a Ordem Minerária” que, até foi apresentado na Câmara dos Deputados para análise, mas disseram que é inconstitucional. Fiquei na dúvida se o erro realmente não foi meu por querer que o Estado fiscalize de forma eficiente o enorme volume de contrabando de metais preciosos, diamantes, esmeraldas e outras gemas preciosas. Fato é que meu anteprojeto foi “sepultado”.
Falando, ainda, em boas leis não posso esquecer de citar a famosa e recente Lei da Ficha Limpa, ainda que tenha que admitir que num país em que o povo precisa de uma lei que o diga que não deve votar em candidato “sujo”, algo está errado. O que aparenta à comunidade mundial é que a educação ética de base não existe ou não funciona.
O perigo maior é que desde a mais tenra idade o brasileiro esteja se acostumando a valorizar “ladrões honrados”, como diz Jorge Bem Jor em sua música “As rosas eram todas amarelas”.
Observe que sem educação Ética na base (a formação do caráter do ser humano) uma Lei como a da “Ficha Limpa” passa a fazer parte de um pacote para enganar o eleitor com falácias (falácia é falsa argumentação) e me lembra o escritor Carl Schmitt em seu livro “Teologia Política” quando compara o Estado moderno com Deus, e a Lei como esperado milagre transformador da realidade física.
Fato é que nossos políticos entendem bem como enganar o povo. Eles são tão bons de estratégia que editam algumas leis boas para combater a improbidade(desonestidade), mas quando percebem que a Nação começou a compreender tal lei, eles a modificam para ela ficar charmosa, mas incompreensível outra vez. Eles e seus partidos sabem que podem investir na (in)capacidade de discernimento dos eleitores, muitos já devidamente doutrinados a não pensarem por si.
Insisto que no Brasil de hoje não basta ser industrial, comerciante bem sucedido, religioso de qualquer que seja o credo, artista, poeta, ruralista rico, juiz, procurador ou policial, porque a virtude não reside em títulos. Aliás, há muito a própria mídia divulga que organizações criminosas “formam” pessoas para ocuparem cargos chave, no coração da República. No Brasil não falta criminoso com diploma e colarinho branco!
Creio que o que pode transformar nossa realidade e nos conduzir a sermos Estado hegemônico (dominante e rico entre os demais Estados do mundo) é a devoção à Nação, de cada agente público. Quando cada pessoa aqui nascida ou que nos adotar como pais, seja croata, japonês ou angolano passar a amar e respeitar a Nação Brasileira, então entraremos nos trilhos do desenvolvimento material e de um espírito ético que pare de venerar “ladrões honrados”.
Há muito os Estados Democráticos de Direito têm sido formados a partir de um pacto com o povo. Cada um prometendo cumprir sua parte no pacto, mas há muito que somente o povo cumpre as cláusulas desse contrato social, enquanto os Estados permanecem no “faça o que eu mando, mas não faça o que eu faço”.
Como no Enigma ou Símile da Caverna, de Sócrates, para quem não conhece a luz do sol, as sombras serão sempre vistas como a realidade.
Nós, o povo brasileiro, temos sido criados numa caverna ideológico-política em que o fogo das falácias (mentiras) que arde em nossas costas tem a fórmula da paixão política cega e não o fogo redentor da educação, que prepara o ser humano para a reflexão crítica.
Por isto nossa lealdade se divide entre partidos que só querem o poder pelo poder e não para servir à Nação brasileira, entre pessoas que prometem um saco de cimento, uma dentadura nova ou mesmo um cargo na máquina pública.
Não estou dizendo que um saco de cimento, uma dentadura ou um cargo não sejam bons ou úteis. O que estou dizendo é que a natureza da troca é que não é Ética, não é justa! O que estou dizendo é que precisamos mudar a cultura de crer em “ladrões honrados”.
Em períodos eleitorais a Teologia Política floresce como nunca. Há até os defensores de credos religiosos que querem fazer o eleitor crer que a “virtude de seu Deus” reside no candidato tal e qual. Se esse cara é tão virtuoso em tempos de eleição, porque vocês já não estavam abraçados a ele por todo o período anterior à eleição?
Que mudança substancial; que avanço sem retrocesso esses “salvacionistas e messias eleitorais” garantiram para a Nação brasileira até hoje? Nenhum!
Eles não garantiram avanço contínuo e seguro! Sabe o porquê? Porque todos eles só governaram para si e para seus protegidos! Eles sabem que no dia seguinte à eleição o povo, mesmo com a barriga e mente vazia de conhecimento “volta a bater na panela e fazer carnaval”…
O matemático grego Teeteto definiu precocemente o “conhecimento” como aesthesis, ou seja, qualquer tipo de percepção. Desta palavra deriva o vocábulo “anestesia” que significa bloqueio da percepção. Me mantenho indagando por quanto tempo o eleitor brasileiro seguirá anestesiado quanto à imprestabilidade do ideologismo político partidário, que somente deseja o poder pelo poder e não pelo bem da Nação brasileira. E, assim, seguem multidões fotos e vídeos de “ladrões honrados” circulando como se fossem mártires.
Por último, mas não por fim, se em períodos eleitoras você se sente alvo do dilema da lealdade dividida, ao menos cuide em examinar bem a quem vai dar seu voto, porque nesse estado de corrupção sistêmica em que vive o Brasil, o justo e o injusto, o honesto e o desonesto, o legal e o ilegal são apresentados ao eleitor como sendo a mesma coisa. Mas, não são!
Há políticos famosos que dizem que a Ética Política tem o direito de ser diferente da Ética (ética é a ciência que estuda aquilo que é justo). Percebe que alguém que diz isto está pedindo ao povo uma espécie de licença para ser o tal “ladrão honrado” ou para que seus apoiados sejam considerados como “ladrões honrados”?
Outro dia, assistindo a série de TV, GOTHAM, me deparei com um episódio chamado Pax Penguina (algo como a “paz instituída pelo Pinguim”) em que o Pinguim (um dos maiores inimigos do Batman) toma o Poder na cidade e institui uma Licença para os criminosos poderem praticar os crimes devidamente sindicalizados.
Na cédula (veja imagem da licença de má-conduta, que abre este artigo) que cada bandido carrega está escrito a especialidade de crime que ele está autorizado a praticar: roubo, sequestro, homicídio, contrabando, saque, etc. Se a polícia abordar algum deles praticando tal crime basta que eles apresentem a Licença dada pela Cidade, que a polícia deve deixá-los seguir impunes com o produto do crime.
Em alguns aspectos essa história me lembra o desorganizado Estado brasileiro que, em matéria de esquemas de corrupção e outros crimes(sejam crimes políticos ou crimes comuns) está tão organizado, mas tão bem organizado, que só falta mesmo instituir a “Pax Penguina” e sindicalizar os bandidos de colarinho branco e os de colarinho sujo e lhes dá a licença para cometer crimes, já que a impunidade o sistema já lhes garante.