Direto de Brasília-DF.
Falar de Fascismo não é falar de ideologia de extrema Direita como a maioria pensa. Ao contrário, é falar de outra forma de Socialismo e, portanto, de uma doutrina social de Esquerda.
Assim, iniciemos por corrigir um erro grave no discurso político de muitas pessoas. Quando dizem que fulano, sicrano ou beltrano é um “Fascista ou Nazista” insinuando ser de “Extrema Direita” erra-se, já que essas doutrinas são defensoras da coletivização e do totalitarismo estatal, ou seja, de uma ditadura de esquerda, estranhamente mesclada com fundamentos do Capitalismo de Estado, já explicado nos artigos anteriores deste seriado.
O Fascismo e sua ideologia socialista possui três versões: o fascismo italiano, o fascismo alemão (inclusive chamado de Nacional Socialismo) e o fascismo japonês. Hoje, trataremos do primeiro.
O termo fascismo, no latim, “fascio littorio” significa “feixe lictoriano”, cujo símbolo era um machado todo enrolado por um feixe de varas. Este machado era usado por alguns servidores públicos (chamados de Lictores) do Império Romano que tinham o poder para executar sentenças a mando de magistrados (entenda-se que no conceito original a palavra “magistrado” não se referia somente aos juízes como querem os brasileiros, mas a todo funcionário público com poder de mando.
Você já deve ter ouvido uma ilustração usada por alguns palestrantes, oradores e sacerdotes, cuja ideologia é fascista. Todas as vezes que um orador conta aquela ilustração dizendo que um pai prestes a morrer reuniu seus filhos e lhes disse que se vivessem separados seriam fracos como uma vara, mas se vivessem unidos seriam fortes como um “feixe de varas”.
Portanto, esse machado enrolado em um feixe de varas chamado de “fascio” ou “fasces” é símbolo de unidade e poder e foi resgatado pelo ditador Benito Mussolini, para se tornar o símbolo do Fascismo, a ideologia que dominou a Itália de 1919 até 1945 na pessoa e governo daquele ditador e, após, sobrevive como neofascismo, no imaginário dos adeptos que não deixam a ideologia tirana morrer.
Fato é que em 1919 B. Mussolini descreveu o Fascismo como um movimento “contra o atraso da direita e a destrutividade da esquerda” e que alguns historiadores defendem a ideia que o Fascismo é uma doutrina centrista. Outros, porém, como o alemão Jurgen Habermas, usavam o termo para descrever os movimentos terroristas de extrema esquerda dos anos 60 até a década de 80. Nesse período nos EUA, principalmente, o termo Fascismo passa a descrever pejorativamente toda e qualquer ideologia esquerdista.
O historiador Roderick Stackleberg coloca o fascismo (juntamente com sua forma ainda mais radical, o Nazismo) do lado direito do espectro político, explicando que “quanto mais a pessoa considerar a igualdade absoluta entre todos os povos para ser uma condição desejável, mais à esquerda vai estar no espectro ideológico. Quanto mais uma pessoa considera a desigualdade como inevitável ou mesmo desejável, o mais para a direita será“
O Professor Louis Wasserman, entendimento ao qual me filio, deu preferência por analisar o Fascismo como uma variante do socialismo. Ele optou por colocar em contraste os princípios que norteiam o individualismo liberal capitalista ante o Socialismo estatizante e defensor da proibição à liberdade individual e da propriedade privada. Eis a explicação de Wasserman:
“Uma visão racional e uma devoção à ideia de vida humana; uma fé calorosa na capacidade de todos os homens para uma melhoria infinita; tolerância à diversidade cultural; dependência do governo popular e a responsabilidade dos governantes para com seu povo; liberdade de professar e criticar igualmente; a beneficência da educação universal; justiça imparcial de acordo com o estado de direito; e uma crença na conveniência da paz internacional. Foi o impacto da Revolução Industrial, mais do que qualquer outra circunstância, que colocou o individualista e o socialista em forte oposição ao quadro social mais condutor para esses princípios.” (Modern Political Philosophies, p. 178)
Para o Fascismo o Estado era o alfa e o ômega social, o princípio e o fim da existência social. O corpo vivo que enfeixa o “espírito da nação” e à qual toda vontade deve estar subordinada, haja vista que o Estado não existe para o homem, mas o homem para o Estado. Este pensamento Fascismo é a alma do espectro político da esquerda marxista, que se desdobra em Socialismo e Comunismo. O primeiro, segundo a ótica Hegeliana e de Karl Marx, deve ser visto como a “isca” usada para atrair a sociedade ao Comunismo, como a minhoca serve ao pescador para atrair o peixe.
O lema criado por Mussolini para conquistar o povo italiano em meio a uma Itália dividida e em crise econômica foi “Ação ao invés de conversa”. Não vejo como dizer que tal lema, em si, seja mal ou ruim. Ao contrário! Se os políticos do mundo fossm do tipo que falam menos e fazem mais, muitos dos problemas sociais que temos seriam resolvidos, independentes de serem de fácil ou difícil solução. Seriam resolvidos, eu lhes asseguro com a certeza dos muitos paradigmas positivos que a História registra!
B. Mussolini com seu lema “Act instead of talking” (agir ao invés de falar) dizia que para conseguir fazer, implementar as mudanças socioeconômicas, quase teológicas, era necessário chamar para si a autoridade absoluta. Ele ancorou seu lema (como um capitão ancora seu navio) em três pilares:
1 – Fazer/agir rápido nos planos, programas e ações políticas (aqui reside, por exemplo o princípio da Eficiência, doutrina italiana que a Constituição brasileira de 1988 adota para nossa Administração Pública, como se vê no artigo 37 da Magna Carta e também no Código de Processo Administrativo Federal/Lei n. 9.784/1999);
2 – Fazer/agir de forma justa. Esta concepção de justiça/ética varia de doutrina social para doutrina social, mas, ainda assim, preciso dizer que por mais que o resultado tenha sido ruim, a maioria das doutrinas sociais nasceu com o ideal de menos sofrimento e mais qualidade de vida para o lado pobre da sociedade;
3 – Fazer unânime, ou seja, sem discussão, sem oposição ao pensar de Mussolini. Esta última característica é a marca de toda e qualquer doutrina fundamentada em dogmas, ou seja, verdades que pretendem ser absolutas. Eis porque o cientista Carl Schmitt escreve sobre a Teologia Política, pois vê nas ditaduras fundamentos por demais semelhantes aos fundamentos religiosos tais, como a existência de um indivíduo que se assemelha a Deus, um culto à personalidade, mandamentos emanados do ditador que, semelhantes aos mandamentos divinos não aceitam oposição nem discussão (para saber mais leia minha COLEÇAO CORREUPÇÃO NO MUNDO, Busque no Google se desejar comprá-la, ou escreva para judivan.vieira@gmail.com).
Note que no aspecto ditadura de Estado com socialização dos meios de produção para alívio de camadas pobres da população, a ideologia (ideologia é um conjunto de ideais) aproxima-se mais da esquerda que da direita política e, mais, ainda, quando elimina por completo a individualidade humana e a diversidade cultural na famigerada pretensão da igualdade de todos, contrária à lei natural do RESPEITO ÀS DIFERENÇAS. Uma terceira característica que irmana Fascismo à esquerda política é que nele não se admite Democracia. Uma quarta é que o no Fascismo não há propriedade. Tudo pertence ao Estado porque o homem existe para o Estado e não o Estado para o Homem.
O Fascismo sustenta que uma vez que o Estado fala por todos, qualquer oposição a ele pode e deve ser considerada um crime e, portanto, é intolerável.
Foi o extremo nacionalismo que fez alguns historiadores defenderem que o Fascismo é doutrina social de direita política, mas o ataque feroz ao liberalismo e a exaltação quase religiosa do nacionalismo dificultou cravar que Fascismo é doutrina de direita política. Mormente quando suas origens estão fortemente vinculadas nos escritos do filósofo alemão Hegel, que junto com Karl Marx deram origem ao socialismo e ao comunismo marxista.
Aliás, por citar religiosidade, julgo conveniente lembrar que foi o próprio Mussolini que induziu o pêndulo histórico para que o Fascismo seja visto como mais uma espécie de teologia política, ao declarar que o Fascismo “é uma concepção religiosa na qual o homem é visto em uma imanente relação com a lei maior, com a suprema vontade que transcende o indivíduo, a fim de atingir a consciência de ser membro de uma sociedade espiritual”.
Esse misticismo “religioso”de Mussolini, alguns cientista políticos e historiadores atribuem ao apreço que ele tinha pelos filósofo Schopenhauer e Nietzsche. Eu peço, todavia, que o leitor não se apresse em crucificar aqueles pensadores, já que a Filosofia não é tirana. Ela, como a arte, admite interpretações várias. Talvez Mussolini tenha cometido o erro da maioria dos leitores do mundo, que analisam um texto e julgam tudo o mais sem pensar que um texto pode não representar o contexto, a ideia final que o escritor queria construir. Um texto é como um nó numa rede de pesca. Um nó não é a rede. É, apenas, um nó…
Como não existe um “todo perfeito”em coisa alguma na vida, julgo importante dizer ser inegável que o Fascismo rejeitou duas das mais importantes posições marxistas. Primeiro negou importância ao papel das forças econômicas como definidoras das relações sociais. Segundo rejeitou a teoria que o Estado não passava de instrumento útil na luta de classes. Talvez aí esteja a mescla do Fascismo que, quase com a indefinição dos adolescentes, tenta se construir como uma espécie de “Frankenstein”, o personagem da escritora britânica Mary Shelley, feito de pedaços de outros seres humanos. O Fascismo é feito de pedaços da esquerda e um leve toque da direita política (quando pega elementos do Capitalismo de Estado) e isto se dá, talvez, porque Mussolini não era de tudo um tolo. Ele lia, ele sabia que Lenin se arrependera de implantar tal ideologia na Rússia e voltara em sua decisão ao ponto de retornar ao Capitalismo de Estado entre 1919 e 1923, ao argumento de que o comunismo era “duro” demais, inflexível demais e precisava de um tempo para ser implementado.
Outros fatos a serem considerados, que jogaram a Itália nos braços de seu ˜Romeu”, Mussolini, foram:
1 – A crise econômica com inflação alta;
2 – A falência da produção rural e urbana;
3 – O número alto de facções políticas todas torcendo umas contra as outras para controlar o que sobrara da Itália do pós primeira guerra mundial;
4 – Os tsunamis de greves em todos os setores da economia;
5 – A invasão de propriedades privadas (como fazia o MST no Brasil);
6 – A desilusão com a crise socioeconômica por parte da juventude.
Esse contexto sócio-político fez o povo italiano abraçar a ditadura de Il duce (título que significa: O líder) e sua violência disfarçada de nacionalismo, como a estrutura piramidal e centralizada de governo que salvaria a nação do caos.
Assim, é possível dizer que a estrutura corporativa no Fascismo absorvia elementos do Capitalismo e do Socialismo. Do primeiro a propriedade privada, só que obrigada a produzir o que o Estado indicava como prioritário. Do Socialismo absorveu e implantou o totalitarismo estatal, com seus muitos conselhos industriais compostos por empregados e empregadores, a discutir os supostos melhores rumos para cada negócio, semelhante ao sistema adotado na Rússia comunista.
O Fascismo, assim como o Marxismo(socialismo e comunismo), tinha um plano doutrinário bem estruturado para lidar com a educação, a religião e a política externa. Na educação o fundamental era incutir devoção quase religiosa na juventude, destacando as virtudes da coragem e do dever como valores supremos.
Na religião o plano era quebrar a resistência inicial que a Igreja Católica (que não aceitava que o indivíduo fosse reduzido a uma coletividade estatal) e cujas disputas cessaram somente com o Tratado de Latrão, assinado em 11 de fevereiro de 1929 por Pietro Gaspari, Cardeal Secretário do Estado do Papa Pio XI, e Mussolini, com o fim de encerrar uma disputa em que o Estado Romano passaria a aceitar o Vaticano como um Estado Independente, fincado dentro do território italiano, como o é até hoje.
Em janeiro de 2013 o jornal inglês The Guardian publicou uma matéria intitulada “How the Vatican built a secret property empire using Mussolini’s millions” ou “Como o Vaticano construiu uma propriedade secreta usando os milhões de Mussolini”. A matéria diz que “o papado utilizou paraísos fiscais offshore (no estrangeiro) para criar um portfólio (uma carteira de investimentos) internacional de 500 milhões de libras, com imóveis no Reino Unido, França e Suíça. (para quem desejar ler, eis o link: https://www.theguardian.com/world/2013/jan/21/vatican-secret-property-empire-mussolini)
Com o Tratado de Latrão a Igreja e Il duce (o cabeça, o líder) se uniram como se unem os inimigos que têm um inimigo em comum. A igreja porque tinha obtido o reconhecimento como “Estado do Vaticano”, a inserção da educação religiosa em todas as escolas italianas e, muito dinheiro para oferecer legitimidade ao Fascismo (segundo o jornal The Guardian) e o Fascismo porque com os favores dado à Igreja, conseguira que fechasse os olhos ao antissemitismo (ódio dirigido contra os judeus) que se proliferaram rapidamente pela Itália (ódio também contra ciganos e homossexuais).
Mussolini, com a legitimidade reconhecida pela Igreja Católica Romana pode avançar sem oposição interna, e dirigir seus planos de conquista ao exterior, exaltando a guerra como a mais alta afirmação do destino de um povo, e como a inquestionável marca da vitalidade de uma nação.
A partir desse momento uma série de atos intimidatórios se somaram para o inicio da Segunda Grande Guerra Mundial, com múltiplos genocídios cometidos contra a humanidade.
Até o próximo artigo. Falaremos do Fascismo Alemão, chamado de Nazismo ou Nacional Socialismo…
Abraço a todos!