No próximo domingo, 03 de julho, é celebrado o Dia Nacional de Combate à Discriminação Racial. De acordo com a Unicef (Fundo de Emergência Internacional das Nações Unidas para a Infância), crianças e adolescentes, em especial as que vivem em contextos de desigualdades, são vítimas do racismo nas escolas, nas ruas, nos hospitais ou aldeias e, às vezes, dentro de suas famílias, deparando-se constantemente com situações de discriminação, de preconceito ou segregação.
Uma cartilha produzida pelo Núcleo Ciência pela Infância (NCPI), baseado em um estudo realizado pela Universidade de Harvard (https://ncpi.org.br/wp-content/uploads/2021/11/Racism-Infographic_2020_pt.pdf), afirma que o preconceito sofrido na infância pode causar impactos sérios no desenvolvimento infantil, já que quando os sistemas de resposta ao estresse das crianças permanecem ativados em níveis elevados por longos períodos, isso pode ter um efeito significativo de desgaste no cérebro em desenvolvimento e em outros sistemas biológicos. Também pode ter impactos duradouros na aprendizagem, no comportamento e na saúde física e mental.
A pedagoga Carollini Graciani, professora do curso de Pedagogia da Estácio, explica que o papel da escola é de extrema importância no combate ao racismo, desde o ensino infantil, trabalhando questões de autoestima, aceitação e respeito às diferenças, lembrando que, especialmente nesta fase, a criança replica o que vê e ouve.
“Nessa fase é natural que as crianças questionem as diferenças entre elas (cor do cabelo, da pele, do olho, altura) e no dia a dia o educador vai trabalhando ludicamente com essas crianças o fato de não existir um padrão, que cada um é único, que nosso país é rico culturalmente, que o cabelo dela é bonito como é, que ela pode e deve amar as características que ela tem, e que ela respeite as características dos amiguinhos, tudo isso por meio de contos e atividades. E sempre, claro, inserindo a família nessa parceria que é educar. E desta forma a criança aprende o respeito ao próximo e a se amar do jeito que é”, afirma.
Já nos ensinos médio e fundamental, a abordagem é diferente, segundo a pedagoga. Nesta fase já se pode ir a fundo em questões históricas e mostrar notícias atuais de pessoas que sofrem preconceito. “O educador nesta fase trabalha responsabilidade, conscientização e respeito, lembrando aos jovens que a sociedade só vai progredir nesta e em outras questões se eles mudarem de atitude e não repetirem atos negativos. E nesta idade, quando um professor presenciar um aluno desrespeitando outro, é necessária uma intervenção pedagógica naquele momento, não pode deixar para resolver depois. É preciso parar a aula e explicar o que é o racismo, como ele se construiu, mostrar, com exemplos atuais, que o negro pode chegar aonde ele quiser, que ele pode e deve ocupar o espaço que ele desejar. Assim trabalhamos a questão do respeito ao próximo e ao mesmo tempo a autoestima daquele que sofreu o preconceito, e é ela que o ajudará a se defender de atos discriminatórios futuros. E mais uma vez, trabalhar junto à família para que este aluno tenha uma postura de respeito com o próximo”, completa.
Consequências do racismo na infância
A psicóloga Sandra Duarte Antão, professora do curso de Psicologia da Estácio, explica que o desenvolvimento humano é acompanhado de alterações físicas, cognitivas e psicossociais, todas acontecendo em um contexto, sendo influenciado por práticas culturais que interferem diretamente na formação da identidade.
“As relações sociais são parte essencial da formação da personalidade, podendo contribuir para o desenvolvimento de aspectos como autoestima, autoeficácia, empatia e altruísmo. No entanto, existem fatores que operam de maneira negativa na vida de uma criança e a exposição ao racismo traz essa realidade, podendo gerar consequências que irão impactar de maneira dolorosa a sua subjetividade. A criança pode ter sentimentos ambivalentes, sentindo-se triste, irritada ou ansiosa, podendo gerar comportamentos como isolamento social, evitação ou ainda agressividade por não se sentir pertencente aquele contexto. Vale lembrar que o preconceito faz parte da nossa sociedade estruturalmente racista, que construiu modelos de beleza e atratividade social, que certamente não considerou a pessoa preta na construção desse referencial”, diz.
A doutoranda em Psicologia ressalta que cabe à família, à escola e aos que fazem parte da formação da criança, contribuírem para práticas que fomentem a construção do sujeito respeitando sua história e suas características, e para que a opressão à qual está vinculada sejam permanentemente combatidas.
“Desta forma, poderemos gerar debates que ofereçam às crianças condições de um desenvolvimento focado em estratégias promissoras que auxiliem na formação de uma identidade segura e protegida, fomentando práticas que conduzirão a formação de um discurso autêntico e sadio sobre si”, opina a professora da Estácio, citando um trecho da obra ‘Pequeno Manual Antirracista’, da escritora Djamila Ribeiro, que diz que “é importante ter em mente que para pensar soluções para uma realidade, devemos tirá-la da invisibilidade”.