Paula Meyer Soares
O ano de 2020 ficará marcado na história mundial e brasileira. Será um ano em que o arrefecimento da economia decorrente do isolamento social devido ao alastramento do COVID-19 será expressivo chegando ao dois dígitos. A lenta recuperação da economia refletirá no volume de arrecadação tributária que tornar-se-á menor a medida em que a atividade econômica demore a recuperar-se.
Os reflexos também são percebidos pelo setor energético. O excedente de energia de contratos assinados no passado por distribuidoras e geradoras é uma realidade. Tais “sobras” de energia não consumidas durante o período de pandemia são negociados na “bacia das almas” na câmara de comercialização de energia. Esse cenário desolador para as distribuidoras que assumem boa parte do risco de mercado terão no futuro a chance de recuperar parcialmente as perdas decorrentes da venda desses lotes excedentes de energia a um PLD de R$ 55,00 contra R$ 285,00 há 2 anos.
Essa narrativa mostra que a pandemia trouxe uma série de pontos que precisarão ser rediscutidos e amadurecidos pela sociedade, agências reguladoras, todo o segmento de energia – geração, transmissão e distribuição- de modo que intempérie como essa da pandemia possam ser melhor “acolhidas” pelo marco regulatório vigente.
A redução da oferta de carga interna no Brasil foi da ordem de 11% comparada com 2019. O desemprego atingiu 14,3 milhões de brasileiros. As distribuidoras de energia enfrentaram e ainda enfrentam um forte desequilíbrio econômico-financeiro, conta esta que será repassada ao usuário de energia elétrica por meio da tarifa de energia. O amortecimento das perdas ocorrerão futuramente devido a esse momento atual de queda de demanda. Os setores industrial, de serviços, setor público foram os que apresentaram maior queda no consumo de energia em 2020.
Todavia, em meio a um período atípico para o setor elétrico, repleto de lições trazidas pela pandemia as instituições que regulam o setor elétrico perceberam os pontos nevrálgicos e o socorro e a flexibilização de algumas regras foi permitida. Dentre elas podemos citar:
- Suspensão de ajustes de tarifas de energia anual e ordinário em 2020;
- Criação da conta COVID-19 com a disponibilidade de R$ 600 milhões de reais oriundos da conta de desenvolvimento energético (CDE) às distribuidoras de energia;
- Concessão de empréstimos por parte de bancos privados e públicos para o socorro de distribuidoras de energia;
- Discussão sobre o fim dos subsídio cruzado as fontes de energia incentivadas (eólica, solar, biomassa e outras) haja visto que não justifica-se a concessão permanente desse incentivo a essas fontes;
- Garantia do suprimento de energia elétrica aquela classe de consumidores de baixa renda e que tem o usufruto de tarifa social de energia;
Tais medidas mostram-se eficazes em meio a um cenário cujo horizonte ainda é incerto e sem nenhuma garantia no que diz respeito quando finalizar-se-á essa questão de isolamento social devido ao alastramento da COVID-19 no país.
Temos em 2020 um cenário de excesso de oferta de energia elétrica. E no longo prazo?? Em um horizonte de 30 e 40 anos?? Quais são e serão os desafios energéticos do Brasil???
De acordo com o Plano Nacional de Energia 2050, o potencial energético brasileiro previsto até 2050 é de 280 bilhões tep. Este valor temos 21,5 bilhões de tep relativos à energias não-renováveis e 7,4 de tep bilhões de energias renováveis. Já a demanda de energia é de 600 milhões de tep para os próximos 35 anos. Isso significa dizer que temos um cenário futuro de excesso de oferta de energia.
O cenário de excesso de oferta de energia mantém-se. Dentro dessa perspectiva o grande desafio é gerenciar a abundância que de acordo com tais previsões e estudos manter-se-ão. O planejamento energético deverá observar essa tendência futura considerando o comportamento de variáveis como: PIB, renda nacional, crescimento populacional, economia externa, mudanças climáticas, eficiência energética, tecnologia. Todos esses elementos interferirão no comportamento da demanda por energia e eis o desafio diante dos nossos olhos para uma nação que enfrenta ainda os percalços de uma crise sanitária acompanhada por crise econômica espalhada pelos quatro cantos do país.
Nos próximos artigos trataremos cada um dos pontos assinalados anteriormente de modo que possamos compreender o futuro do setor elétrico brasileiro.